quinta-feira, 4 de outubro de 2007

Simpsons

Aproveito toda a balbúrdia causada pela máquina de promoção norte americana em torno dos Simpsons para fazer uma comparação entre o Brasil e os EUA. Acho que, depois da política de boa vizinhança promovida pelos dois países no pós-guerra (onde Walt Disney em pessoa veio a mando do presidente Roosevelt, e depois de ter ouvido piada de preto, pobre e puta, optou pelo pelo politicamente correto e só nos retratou como vagabundos e malandros criando o Zé Carioca) nunca havia tido outra ocasião onde as altas cúpulas se relacionassem por causa de um assunto envolvendo animação.

Os Estado Unidos são infernais. Não só enfiam o que produzem goela abaixo de todo mundo no mundo todo ( Simpsons é exibido em mais de 60 países. Nada mal levando-se em consideraçao que há 194 e a maioria é protótipo) como ainda conseguem fazer parecer novidade o que já tem 18 anos e todo mundo está cansado de ver.

Bom, cansado numas. Toda vez que estou zapeando, se cai nos Simpsons, fica.
Já devo ter assistido cada episódio umas 5 vezes. Sem contar, lógico, os da oitava temporada pra cá , quando não devo ter assistido a um episódio mais de duas vezes. Isso se deve à saída do criador e roteirista Matt Groening, que deu linha para ir se dedicar a "Futurama" contribuindo apenas ocasionalmente com “ Os Simpsons”.

Mas falar de todas as virtudes da série fica para uma outra ocasião. Se bem que nem sei se é preciso porque já teve até filóso analisando Homer, o que pessolamente, considero mal de começo de século.

Então,em suma, o quanto "Os Simpsons" é bom é uma outra história.

O que não é uma outra história é o grau de infantilismo vigente no Brasil que, em certos aspectos, não é superado nem pelos americanos. Gente da potência mais infantil de todos os tempos.

Todo mundo deve saber... Na décima terceira temporada dos Simpsons, Lisa vai ao Rio. O lugar é uma bagunça. Carro na rua que é bom, neca. Ao invés, crianças sem pais e macacos.

Tiram uma com a nossa sexualidade, Homer é sequestrado e levado para a floresta amazônica (que fica logo ali na esquina), Bart é engolido por uma cobra e por aí vai. Achei o episódio fraco, não ri, desliguei a televisão e fui dormir.

Algum magano da secretária de turismo do Rio, que devia estar de ceroulas, se sentiu ofendido e foi ligar pro seu chapa (e chefe), José Eduardo Guinle que, no dia seguinte, lançou na banca que o advogado do órgão, Marcelo Parente, processaria a Fox.

Quando vi a notícia no jornal, aí sim, eu ri.

Se o senhor Guinle tivesse feito uma pesquisa num Google qualquer da vida ou conversado com alguém menos tosco teria ficado, no mínimo, chateado por saber que se a lista tivesse sido elaborada por grau de relevância ( e aparentemente, considerando que o show é feito para um público médio, foi), nós ficaríamos atrás dos

australianos
ingleses
italianos
franceses
alemaes
japoneses
e americanos

No caso, os americanos deviam estar no topo da lista pelo número de citações.
Nenhum povo jamais foi alvo mais frequente dos roteiristas do show do que os próprios.
Vejam só o Homer. Não é claro sua ancestralidade primata? É assim que o americano médio é retratado no show. Sem contar os bêbados, os empresários sem escrúpulos, os diretores de escola vetrenos de guerra paranóicos, a falência das instituições de ensino, a amoralidade das corporações, a corrupção dos governantes, a imbecilidade do presidente, pfffff. Vai embora...

E quando é sobre nós, o governo permite que a insania se instaure.
Digo “O governo” porque o então presidente Fernando HenRIQUINHO chegou a se pronunciar, ainda que não oficilamente, a favor da decisão de processar a Fox. É, ele mesmo, o intelectual diplomado na Sorbonne.

Não sei o que deu na cabeça do ex-presidente. Hoje em dia ele deve pensar no que aconteceu e dizer "Ruth, meu Deus, que papelão". E a Ruth:

"É, Fernando. Queimar todas as nossas reservas numa paridade irreal e fazer uma privatição porca daquele jeito ainda vai...mas processar os Simpsons, homem de Deus...."

Depois de algum tempo o produtor do show James L Brooks, fez um pedido de desculpa formal. Disse o seguinte, em tradução livre:

"Nós nos desculpamos à adorável cidade e ao povo do Rio. Se isso não resolver a situação, Homer Simpson se oferece para enfrentar o presidente do Brasil no “Celebrity Boxing”.

A declaração foi dada ao site do canal de entretenimento E!.

"Celebrity Boxing" é um reality-show da Fox, mesma produtora dos Simpsons, em que "celebridades" do segundo escalão do showbiz lutam boxe num ringue de verdade. Paula Jones (que ficou famosa ao acusar o ex-presidente Bill Clinton de assédio sexual) e o "rapper" Vanilla Ice são algumas dessas celebridades que já passaram pelo programa.

O magano de ceroulas deve ter ficado putinho de novo, mas aí deve ter conversado com alguém menos tosco que deve ter lhe dito: Pô, Zé. Larga mão, ô meu. E ele deve ter ido jogar botcha.


Mas eu disse que compararia O Brasil aos Eua. Beleza então...

Diferentemente da amada idolatrada salve salve, nos Eua, pelo menos, o jogo é mais justo. Eles têm uma série de emendas e elas são garantidas a todos os cidadãos, quer o governo goste ou não. Uma das emendas sobre a qual eles mais gostam de bater na tecla é a primeira. A da liberdade de expressão, que deixa claro que o governo jamais poderá legislar contra o direito dos cidadãos, ou da mídia, ou do raio que o parta de dizer o que pensam. Eles são infernalmente democráticos (no sentido de lógico, poderem falar o que quiserem, menos o auto-censurável).

Simpsons vai ao ar na Fox, emissora de Rupert Murdoch. Um Roberto Marinho que ainda não bateu as botas elevado a 11, considerando o tamanho de seu império e o seu poder de influência. Rupert também me sugere ser mais flexível do que Roberto, pois Roberto, até sua morte, nunca correu riscos mexendo na grade de programação do horário nobre da Globo, que deve ser a mesma há uns setecentos anos.

Noves fora, Rupert Murdoch é o dono da Fox e na Fox passa o Fox News que na boa... é o maior panfleto pró-republicano da paróquia. Tenho lá algumas simpatias pelos republicanos, porque sou de direita, mas durante o mandarinato desse débil mental do Bush, não consegui expressar nenhuma.

Pois bem. Não é que logo depois de toda aquela empulhação sobre a necessidade da invasão do Iraque promovida por cada edição dos Fox news, entrava os Simpsons, mostrando um ponto de vista completamente contrário, retratando o partido republicano como sendo composto por uma patota de gente estúpida e amoral que se reúne no topo de uma colina num castelo mal-assombrado?

Para constar... os membros do partido republicano no desenho são Krusty, o palhaço, O prefeito Quimby, Montegomery Burns, chefe do Homer, entre outros. Quem assiste ao show sabe o que isso significa. Para quem não assiste, eu quebro um galho... São os maiores filhos da puta de Springfield.

Essa é uma situação onde a vida cotidiana se depara com a realpolitk. Imaginem que se algum dia, houver algum tipo de humor no horário nobre que vá além da estupidez de Zorra Total e A Praça é Nossa, os produtores correrão o risco de terem de se justificar ao governo por terem dito coisas que o governo não gostaria de ouvir. Como na época dos militares, mas sem a tortura, a Embraer ou o pró-álcool.

Pena. Porque quem quiser estudar a história dos Estado Unidos daqui a 100 anos, terá além da fonte oficial, a possibilidade de saber qual era o ponto de vista de quem pensava diferente da máquina. Aqui, o interessado só poderia acesssar os arquivos do Globo Repórter, Retrospectiva 2007.

Eu, hein. Vade retro.

Adeus

Eric Lovric