segunda-feira, 12 de maio de 2008

Fui num Pagode na casa do Gago ou: Walt Hitler encontra Adolf Disney

Fui no churras do pessoal da Facú. Galera sussa. O anfitrião me ligara pedindo também outro grande favor, que resolvi aceitar mediante condição: que ninguém me pedisse para tocar nem Raul, nem “Wish You Were Here”, nem “Stairway to Heaven”. Ele riu da piada. Que piada?

Havia poucos gatos pingados quando cheguei, porque fiz a bobagem de chegar só hora e meia depois do horário sugerido. Saber eu sabia, tanto que inclusive, já fui almoçado. Churrasco, só almoçado. Casamento, só jantado. Se tudo der muito certo, o máximo em desconforto é ter que comer duas vezes. Melhor sobrar que faltar.

Bom, chegando mais cedo, raciocinei, posso sair mais cedo e fazer o que tenho para fazer porque sempre tem coisa pra fazer. O raciocínio, é pena, só funciona quando a razão e o bom senso não são ultrajados, o que é de praxe em churrascos.

Havia uma garota... seu rosto anunciava o seu QI. Inversamente proporcional à meiguice. Preferi o xaveco número sete, porque não estava conservador naquele dia, mas quebrei a cara porque ela não costumava assistir o Scooby Doo quando criança, não conhecia o Salsicha e não sabia o que era “larica”. Não pegou a piada. Lhe preferiu mais falar sobre os absurdos dos jornais. Fui-me alhures.

Me cercaram uns filisteus. Fulano, mais cicrano e beltrano. Passei a mão na testa para ver se tinha plaquinha dizendo “alugai-me”. Nada tinha e nada entendi.

Um me disse das melhorias no carro. Faróis de milha, rebaixamento e funilaria, se não me engano. Os outros dois estavam invejosos. Nada disseram, mas via-se.

Tinha uma galera bebaça. Mas tudo bem, porque pode. Senão, não teria propaganda com gente bonita na televisão. Do que não tem propaganda é que não pode, porque faz mais mal. Vicia e as pessoas fazem coisas que não fazem quando estão no seu normal. Se o governo decidiu, tá decidido.

Conversei com alguém. Gente boa até. Tiago ou Diogo ou Diego. Não lembro. Falou que nunca tinha imaginado que de fato Walt Disney e Hitler tinham várias coisas em comum. Hitler era artista frustrado. Walt também. Walt, assim como Adolf, tinha várias idéias que apeteciam às massas e, sendo artista medíocre, contratou gente talentosa para executá-las. Os dois odiavam judeus, crioulos e toda a "ralé". Os dois também adoravam o clássico e repugnavam o moderno. Os dois usavam bigodinhos de gosto duvidoso.

Dolfinho. Ou será o Waltinho?

Os dois lutaram na primeira guerra e ambos “viram a luz” entre balas e morteiros. Adolf, quando foi ferido - e então no hospital militar - deu vazão à sua criatividade escrevendo o Mein Kampf. Walt, quando dirigia ambulância na França e teve contato com os livros de autores e ilustradores europeus do século 19. Walt encaixotava e mandava tudo o que podia de volta para a América, e foi assim, tendo milhares de livros como material de referência, que conseguiu fazer com que seus artistas recontassem os contos clássicos europeus com tamanha maestria. Afinal, de Branca de Neve à Bela Adormecida, passando por Pinóquio e Cinderella, tudo é adaptação de conto antigo, nada é história original. E mesmo Walt tendo mudado as partes para as quais não tinha estômago, não conseguiu suprimir todo o horror contido em Branca de Neve, por exemplo. Pra criança my ass...

Mas, verdade seja dita, havia diferenças. Adolf era revolucionário. Walt, reaça. E Adolf tratava os seus próximos muito melhor do que Walt. Certa vez, a esposa Lillian advertiu Walt sobre como Ub Iwerks olhava para ele como se quisesse matá-lo. Ub foi quem de fato criou o Mickey e animou os primeiros trabalhos quase que completamente sozinho. O recorde de desenhos feitos num dia acho que ainda é dele. Setecentos.

Walt e Ub - final dos anos 20

Em 1928, Ub elevou Mickey a status de “star” em Steamboat Willie e ainda assim Walt não ouviu Lillian, continuou a destratar Ub e perdeu-o, como viria a perder muitos de seus melhores artistas. Sem contar o perrengue pelo qual teve que passar e os sapos que teve que engolir durante a grande greve do seu estúdio, em 1941.




Greve...

Hitler seduziu o mundo transformando arte, ainda que de gosto debatível, em propaganda política. Funcionou horrores, mas eu acho baiano. Aqueles estandartes, todo mundo vestindo falando e pensando igual na mesma hora. O filistinismo bovino... Arghh! Walt tinha muito melhor gosto.

Mas o Diogo (ou seria Tiago?) e eu concordamos que embora Walt tenha praticamente escrito a bíblia de como enfiar produtos goela abaixo de todo mundo, o legado de Hitler foi muito mais nefasto, pois o estilo de propaganda que o seu ministro Goebbels inventou rende frutos até hoje, sendo amplamente usada por Michaels Moore e Georges Bush. Igualzinho.

Às tantas, pensei “vou-me”, mas errei ao anunciar porque rolou o “ficaí!”. Sempre rola o ficaí!. Fui, levei o violão, cantei canções e até Kaiser bebi, mas, na hora de ir embora, em uníssono:

- Qui, ô! Magina! Ficaí!
- Não, eu tenho que ir...
- Deixa de frescura. Ficaí!!!! Toma mais um limão que você fica bão.

Fiquei, mas só o suficiente para esquecerem que eu estava lá e então pratiquei uma saída pela esquerda à francesa. Um sujeito desolado que fitava a rua, me perguntou se eu ia para o norte. Respondi que para o sul. Agora mais desolado, ele disse que tinha vindo com um amigo e que agora queria ir embora, mas seu amigo queria ficar. Muito provavelmente até o final. Pelo tom que adotou, “até o final” parecia haver uma eternidade. Fazer o quê? A vida é afogamento e salva-se quem pode. Fui-me.

Esse pesadelo costumava ser recorrente quando eu era adolescente. Hoje, menos. Têm outros do tipo, afinal a ditadura social encontra várias formas de nos encher os pacová.

Ah, e em tempo.... Ninguém pediu para eu tocar nem Raul, nem Led, nem Pinky. Mas uma indiferente bradou: “toca um forró!”. Pena que eu não estava com a minha gaita para que ela pudesse pedir Beethoven.

Adeus

2 comentários:

Iatã Themudo Lessa disse...

prezado Sr. Lovric,
Apesar de minha situação mais próxima a uma escravatura, imposta
cruelmente pelos produtores de suco de cevada com gás carbônico, tenho acompanhado, na medida do possível, suas elocubrações filósóficas.
Tenho apreciado deveras.
Especificamente no caso do Hitler x Waltz, ouso sugerir que valeria
a pena você gastar um post com aquela paranóia conspiratória que gira em torno dos patos -personagens: por que ninguém tem filhos, só sobrinhos?
Por que o Pato Donald sai de toalha se a roupa dele não cobre em
baixo,etc...
Lembranças à Dona Elza.

Ana disse...

Afe, Kaiser não dá, Eric! (muito boa a aula Walt-Adolf) Bjo!