Cheguei no estúdio semana passada e me dei conta que se antes eu não era lá muito junino, hoje, odeio arraiais, porque o prédio onde trabalho está colado a uma escola e tive que passar Junho ouvindo toda a martelação dos ensaios de quadrilha todo dia o dia inteiro. Alguém aí sabe quem diabos compôs "pula a fogueira iáiá"? Forca ao cretino.
Em menino, gostava de ver os balões, com fogos, subirem. Mas gostava também quando eles não subiam e explodiam
Cheguei em casa segunda passada e para espairecer, liguei a caixa bestificante. Assisti ao “CQC” (custe o que custar), novo programa do Marcelo Tas (Bandeirantes, segunda às 22:00). Mesma coisa que “Pânico”. Só que reformado para agradar o pessoal da “Zona Sul”, como diriam os habitantes do longínquo Leste. Morar numa cidade do tamanho da Suíça pode ser pitoresco, se soubermos olhar para a direção certa.
Tas, como sempre, competente, antenado e digital. E mais que suficientemente inteligente para saber que embora seu programa seja a mais nova sensação da comédia nacional, não pode se dizer que seja a reinvenção da roda (na verdade o programa é uma franquia argentina, e Tas já fez melhor, com Ernesto Varella).
Engraçado o programa é. Lógico que se o alvo da piada fôssemos nós ao invés do outro, seria trágico. Existe uma linha muito tênue entre a tragédia e a comédia. No caso do Brasil, para achar essa linha, só com microscópio.
Os repórteres de Tas saem pela cidade para ver se as regras de estacionamento para deficientes são respeitadas. Descobrem que não. Aí vão à Assembléia Legislativa onde, como era de se esperar, também não são.
O repórter parece achar um absurdo que um deputado não respeite a lei e estacione na vaga. O pega de calças curtas, o embaraça. Faz com ele o que quer. Lógico que é engraçado. Pode imaginar um deputado sadio tentando se justificar ao ser pego de surpresa estacionando numa vaga para deficientes? Se deputados são assim, o que poderia se esperar do povo? E é aí que começa a tragédia.
Talvez o repórter saiba, talvez não. Tenho cá minhas apostas. Mas se o deputado fosse um monarca vindo de uma linhagem milenar criada exclusivamente para mandar, as chances dele ser um cretino seriam menores. Às tantas, o ocidente escolheu pôr o povo no poder e chamou o tal regime de democracia.
E aí passaram a dizer que cada povo tem o governo que merece. Lorota. Em democracia, cada povo é o próprio governo. E pelo que vejo todos os dias na rua, sobretudo no trânsito, não existe nenhuma diferença entre deputados e vassalos. Existem exceções, mas ambos acham que o legal mesmo é ir dormir sabendo que a vantagem foi deles. É assim que funciona por aqui. Ponto. Pronto.
Mas a pior tragédia ainda, eu acho, não é querer levar vantagem. É entrar e sair ano e não nos reconhecermos como o que realmente somos. Tentando fingir que seremos felizes quando chegarmos a níveis de Europa. Ainda que fingindo superioridade enquanto não o formos. Ainda que, feito macacos, imitando o pior que os Estados Unidos têm a oferecer. A má notícia é que se a maioria das pessoas soubesse o quanto custa ser Europa, notaria que jamais poderíamos arcar com a conta. A boa, é que não existe pedra onde tenha sido gravado que temos que se ser como os europeus ou americanos. Não nos custaria nada assumirmos o que somos e, de onde estamos, tentarmos inventar um novo modelo.
Mas cá entre nós... levantar pra quê, se o berço é esplêndido? O Bilac manjava...
Mas do que eu falava mesmo? Ah, sim. De sermos um povo super gente boa que se preocupa muito pouco com o próximo. Isso me lembra um desenho do Popeye, onde o pai dele chegava de ressaca e para poder se recuperar, pedia que o filho fizesse a cidade calar a boca. Que mané senso de coletividade o quê. E quem nunca piorou a vida de outrem por não dar seta ao virar à direita ou esquerda, que atire a primeira lata de espinafre (haja lata).
Quiet Pleeze.1941
Popeye foi criado por E.C. Segar para quadrinhos, em 1929, mas quem popularizou o personagem foram os imãos Dave e Max Fleischer. Esses sim, inventaram a roda e muito mais. Dave era um artista nato, odiava a escola e só se interessava pelo que realmente importava. Já Max tinha como paixão a mecânica, e chegou inclusive a ser editor de arte da Popular Science Monthly.
Do cruzamento da arte com a ciência nasceu primeiro o rotoscópio. Uma máquina que permitia aos animadores desenharem em cima do filme, dando um efeito realista às cenas. Eu particularmente não morro de amores pelo efeito, mas tem gente que acha supimpa. Tanto que fizeram séries/filmes inteiros usando a bugiganga. Você com certeza conhece a rotoscopia. Seguem exemplos. Verifique se de fato acha bonito
Delta State. A primeira série de tv totalmente rotoscopeada. Feita pelos estúdios Nelvana, canadense e Alphanim, francês, em 2004
Lembram do A-há? Pois é. Rotoscopearam “Têique ón mí”
Antes disso, Marx e Dave ganharam notoriedade por volta de 1919 com Koko de Clown, numa série chamada “Out of the inkwell” (saído do vidrinho de tinta) onde personagens em desenho e gente de verdade contracenavam. E aquele coelho panaca do Roger Rabbit, em 89, achando que estava inventando a roda.
Koko’s Earth control. 1928. Muito, mas muito antes de Roger.
E acabaram inventando também a bolinha que saltitava sobre a letra da música para o povo cantar junto, inventando assim tanto a interatividade quanto o som em filmes (havia um tocador de órgão no cinema, que providenciava o som). E inventaram a participação de gente de verdade em desenhos, quando faziam Betty Boop, que alcançou os píncaros da glória em 1931. E esses Simpsons achando que inventaram alguma coisa.
Essa semana estréia “Wall-e”, mais um filme 3D da Pixar. Já comprei o ingresso, porque deixar de ver filme da Pixar no cinema fica deselegante. E pensar que Dave e Max inventaram em 1933 uma máquina que já simulava a idéia de 3D. A Pixar é duca, mas nêgo sair por aí dizendo que eles inventaram o cinema 3D não pode. Fica deselegante.